Nas várias reuniões que a ANVPC realizou com a tutela alertou para a necessidade imperiosa de ser salvaguardada a equidade e a igualdade de oportunidades entre professores contratados, sem as quais a aplicação do n.º 2 do art.º 42º do D.L. n.º 83-A/2014 de 23 de maio (vulgarmente conhecido por norma-travão) traria novas injustiças, que perdurariam nos anos seguintes e conduziriam a inevitáveis conflitos judiciais.
A partir de uma análise das listas de provisórias de graduação, publicadas ontem, verifica-se que inúmeros professores contratados a termo (com 5, 10, 15, 20 e mais anos de tempo de serviço docente, na entidade patronal Ministério da Educação e Ciência – MEC), permanecem longe da almejada, justa, e legítima aspiração de vinculação aos quadros do MEC. Nessa medida, a aplicação da norma-travão não resolveu a precariedade a que os professores portugueses têm sido sujeitos e, na leitura desta organização, não dá resposta ao que se encontra estipulado na Diretiva 1999/70/CE do Conselho de 28 de junho de 1999 (respeitante ao acordo-quadro CES, UNICE e CEEP relativo a contratos de trabalho a termo). Antes pelo contrário, o modelo que o MEC estabeleceu para operacionalizar este normativo europeu agrava a discriminação laboral entre professores, uma vez que, no limite, pode ocorrer que docentes que tenham 5 anos de tempo de serviço (obtidos através da celebração de 5 contratos anuais, completos e sucessivos nos últimos anos) passem a integrar os quadros, e o mesmo não aconteça com professores com 20 anos de tempo de serviço (mesmo que já possuam 7, 8, ou mais contratos em horários completos, anuais e sucessivos, em qualquer momento do seu percurso profissional, mas tenham alguma interrupção contratual, muitas das vezes por curtíssimos períodos de tempo, sendo estas alheias à sua vontade e resultantes, em grande parte, da ineficiência da máquina concursal do MEC). Nesse sentido, e para minimizar estas injustiças, a ANVPC sempre defendeu, e propôs, a flexibilização na extensão da aplicação da norma-travão a um maior número de professores, já no concurso nacional de 2015/2016.
As graves perturbações e ineficiências ocorridas na colocação de docentes nos últimos 2 anos, amplamente divulgadas pelos meios de comunicação social, deram lugar a um elevado número de queixas dirigidas ao Provedor de Justiça e conduziram a que este endereçasse ao Secretário de Estado do Ensino e da Administração Escolar, em 20 de fevereiro de 2015, um conjunto significativo de reflexões e sugestões, com o objetivo de evitar a repetição dos problemas ocorridos e, assim, contribuir para o aperfeiçoamento da ação administrativa. No ano letivo 2013/2014 as colocações de professores somente ocorreram em 12 de setembro e em 2014/2015 em 9 de setembro. Existem, a título de exemplo, docentes cujos horários foram requeridos pelos diretores das escolas nos primeiros dias de setembro e que, por via dos atrasos das colocações, imputáveis ao MEC, interromperam os contratos sucessivos que vinham celebrando há anos e anos a fio, e que, por tal facto, não lhes viram aplicado o n.º 2 do art.º 42º do D.L. n.º 83-A/2014 de 23 de maio.
Face ao exposto:
1) O que pensa fazer o Ministério da Educação e Ciência, para não violar o princípio da igualdade de tratamento entre cidadãos, a todos os docentes que interromperam, nos últimos anos, os seus contratos sucessivos por 10, 20 ou 30 dias, por não verem as suas colocações retroagir a 1 de setembro?
2) O que pensa fazer o MEC para resolver a precariedade dos professores contratados que desempenham funções docentes há 5, 10, 15 e 20 anos, que se têm revelado como necessidades permanentes do sistema educativo público, muitos dos quais se encontram a lecionar novamente, no presente ano letivo, em horários completos e anuais, e vão assistir à perpetuação da sua precariedade?
3) O que espera o MEC para dar cumprimento à Resolução da Assembleia da República n.º 35/2010 de 4 de maio, e que resolveria, em grande maioria, o problema de instabilidade profissional dos professores contratados portugueses?
4) Quando pensa o MEC definir objetivamente o conceito de sucessividade contratual, em conformidade com pareceres nacionais e internacionais que consagram que a interrupção de dois contratos por curtos períodos de tempo não são suscetíveis de quebrar a sucessividade contratual, pois um conceito rígido do carácter sucessivo de vários contratos de trabalho subsequentes permitiria contratar trabalhadores, de forma precária, durante anos a fio?
Ainda que em muitos grupos de recrutamento as vagas apresentadas pelo MEC para o Concurso Externo para o ano letivo 2015-2016, sejam bastante superiores ao número de docentes graduados na 1.ª prioridade (possibilitando a consequente entrada no quadro dos professores mais graduados da 2.ª prioridade), cabe ao Ministério da Educação e Ciência apresentar soluções claras, a curto e médio prazo, para a resolução definitiva da precariedade docente, promovida pelos mais variados governos. Veja-se que, por si só, a aplicação da norma-travão não se pode configurar como “o” mecanismo de entrada nos quadros do MEC, devendo a tutela criar um sistema para articulação correta da mesma com uma necessária vinculação cumprindo os requisitos da ordenação pela graduação profissional dos professores que desenvolvem, há muitos anos, funções em escolas diretamente tuteladas pelo Ministério da Educação e Ciência.
Tendo em conta as novas discriminações que foram criadas com a operacionalização, pelo Estado Português, da norma-travão, parece não resultar outra alternativa aos professores contratados portugueses que não seja retomarem as suas ações judiciais individuais (que muitos dos associados da ANVPC já deram autonomamente entrada nos tribunais administrativos portugueses logo após a publicação, em maio de 2014, do n.º 2 do art.º 42º do D.L. n.º 83-A/2014) e de criar um novo movimento para denunciar à Comissão Europeia a manutenção, pelo Estado Português, da utilização abusiva de contratos de trabalho a termo e a consequente violação do que se encontra consagrado na Diretiva 1999/70/CE do Conselho de 28 de junho de 1999.
No entanto, paralelamente, a ANVPC não descurará a promoção da continuidade da discussão pública em torno da problemática da precariedade docente em Portugal, com os mais variados tipos de entidades nacionais e internacionais, uma vez que face à gravidade da mesma, e paralela legitimidade desta luta, acredita ser possível a apresentação a curto prazo, por parte da tutela, de uma medida definitiva para a resolução do problema, tendo em conta o número de professores de carreira que saíram do sistema nos últimos anos, e a consequente continuidade de contratação de um grande volume de docentes para satisfação das necessidades permanentes do sistema público de educação.
Esta organização divulgará, nas próximas semanas, novas ações de luta.
A direção da ANVPC
21.04.2015