Caro associado, as negociações em curso entre o MECI e os sindicatos incluem propostas de reformulação do Decreto-Lei 32-A/2023. A ANVPC reconhece o longo caminho já percorrido e os avanços alcançados para a dignificação do processo de vinculação dos professores contratados, e orgulha-se dos contributos que deu neste trajeto. No entanto, persistem alguns aspetos do DL32-A que estão a provocar situações injustas e que importa melhorar ou eliminar.
Assim, a nossa associação tem apresentado um conjunto de propostas concretas, procurando tornar o regime de concursos mais justo, transparente e racional. Importa sublinhar que estas recomendações, longe de constituírem um exercício teórico ou meramente circunstancial, decorrem de um conhecimento direto do terreno e já foram apresentadas, por diversas vezes, a diferentes entidades políticas desde os grupos parlamentares até ao próprio Ministério da Educação. Após as primeiras rondas negociais entre o MECI e os sindicatos, constatamos com desilusão que nenhuma das propostas que apresentamos foram consideradas. Como julgamos importante aproveitar esta oportunidade em que o MECI se dispõe a alterar o DL 32-A, divulgamos aqui as nossas propostas.
Defendemos que os mecanismos de concurso e vinculação definidos no Decreto-Lei 32-A/2023 sejam justos e equitativos. Para isso, é necessário simplificar critérios, garantindo que todos os docentes possam usufruir de oportunidades iguais e transparentes no seu percurso profissional. Este ponto é crucial para promover maior estabilidade no corpo docente e uma gestão mais eficiente dos recursos humanos no sistema educativo, respondendo às reais necessidades das escolas e dos professores.
- Propomos que seja revisto o número 2 do artigo 6º pois consideramos que, verificando-se habilitação adequada, não deve haver qualquer entrave aos docentes que desejarem concorrer para grupos de recrutamento diferentes. A limitação de concorrer a apenas um grupo disciplinar, que nunca existiu até este diploma, é um obstáculo à gestão eficaz e racional dos recursos humanos.
- Defendemos que não se deve avançar com a implementação da “gestão local de docentes”, pelo que propomos a revogação da secção II (Preenchimento local de necessidades temporárias) do capítulo III (artigos 26º e 27º). Propomos ainda a revogação do disposto no número 2 do artigo 25, dos números 2 e 3 do artigo 28 e de todo o artigo 29.º, pois consideramos que os horários compostos são incompatíveis com a profissionalidade e a dignidade docentes. Além da medida se afigurar de difícil operacionalização, este modelo constitui uma falsa solução ao problema da falta de professores.
- Poder-se-á afirmar que a adesão a estes horários é livre no momento do concurso, mas a ameaça, ou contrapartida em cima da mesa é, na verdade, o desemprego.
- É verdade que já existem docentes que acumulam horários pequenos em escolas diferentes, mas essa decisão é tomada exclusivamente pela absoluta necessidade de completar horário para acumular tempo de serviço e auferir uma retribuição financeira menos indigna.
- As escolas em que estes professores trabalham desejariam tê-los a tempo inteiro, caso tivessem créditos horários disponíveis para o efeito, que seriam aplicados em atividades necessárias, mas deficitárias em recursos humanos. E cada um destes professores desejaria dedicar-se plenamente a apenas uma escola.
- Precisamos de mais professores nas escolas, para fazer face às múltiplas exigências que enfrentamos diariamente e a gestão local de colocação docente e os horários compostos, previsivelmente, promoverão a saída de ainda mais professores das escolas.
- Na sequência deste entendimento, propomos uma reformulação do conceito de horário incompleto.
- Todos os horários docentes deverão ser considerados completos. Tem de existir um mínimo de envolvimento do docente com o projeto educativo de uma escola e isso não se consegue tratando-o como um tarefeiro. A atividade docente não pode ser encarada como um conjunto de tarefas dispersas. Ser docente implica assumir como seu o projeto educativo da comunidade escolar, implica estar envolvido no clima e cultura de escola, e para isso acontecer o horário do professor deve refletir esse envolvimento.
- Faz todo o sentido usar os recursos que já existem na escola, nomeadamente os professores que têm horários incompletos. A falta de docentes cabimenta esta proposta e poderá ser mitigada por ela. Qualquer escola, mesmo aquelas que não têm falta de professores para a lecionação, têm necessidades que só podem ser supridas por docentes, como apoios, apoios tutoriais, etc.
- Assim, propomos que se deve entender o horário de um professor como uma «unidade de serviço docente» que não deve mudar quando se pede uma substituição temporária. Se o horário é completo para o professor A, deve ser completo para professor B que o vem substituir. A componente não letiva de um horário também constitui trabalho. Assumir um horário deverá implicar assumir todas as responsabilidades do substituído (excetuando, obviamente, as relacionadas com a coordenação ou gestão escolar). Isto aumentaria a disponibilidade dos candidatos a alargar o âmbito geográfico de escolas em que, na Contratação Interna e Reserva de Recrutamento, indicam disponibilidade para horários temporários.
- No respeitante à Vinculação Dinâmica (artigo 43º):
- Propomos que se elimine a exigência de o docente estar a lecionar a 31 de dezembro do ano anterior ao da abertura do concurso; esta exigência fomenta claramente ultrapassagens entre os candidatos, e que, em grande parte dos casos, não depende de tomada de decisão dos docentes, mas sim de especificidades decorrentes das circunstâncias de cada horário a concurso (nomeadamente no caso dos afetos a professores colocados em regime de substituição).
- Propomos que se exijam apenas 1095 dias de tempo de serviço acumulados nos últimos 6 anos escolares.
- Propomos que se simplifique a alínea b) do n.º 1 eliminando as subalíneas i) e ii) e aumentando de 2 para 3 o número de anos em que se exige contrato celebrado com o Ministério da Educação.
- Propomos que o tempo de serviço a que se referem critérios deve ter sido prestado com habilitação profissional, evitando a vinculação de professores sem a formação completa e os problemas administrativos e logísticos daí decorrentes.
- Sugerimos a seguinte redação para o número 1 do artigo 43.º:
«1 – Sem prejuízo do disposto no n.º 12 do artigo anterior, há lugar à abertura de vaga, no grupo de recrutamento em que o docente possui qualificação profissional e no QZP em que se situa o AE/EnA onde aquele se encontra a lecionar a 31 de dezembro do ano anterior ao da abertura do concurso, desde que preencha cumulativamente as seguintes condições:
a) Possua, pelo menos, 1095 dias de tempo de serviço para efeitos de concurso, prestados nos últimos 6 anos escolares, com qualificação profissional;
b) Tenha celebrado contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo com o Ministério da Educação nos 3 anos escolares anteriores, com qualificação profissional.»
- Consideramos que uma alteração do nº 2 do artigo 42º do Decreto-Lei n.º 32-A/2023 seria mais consentânea com o propósito de garantir a abertura de todas as vagas reais, e garantia uma convergência real com o Código do Trabalho. Assim, propomos a seguinte redação:
«2 – A sucessão de contratos de trabalho em funções públicas a termo resolutivo celebrados com o Ministério da Educação na sequência de colocação obtida em horário anual e completo, no mesmo grupo de recrutamento ou em grupos de recrutamento diferentes, não pode exceder o limite de dois anos ou uma renovação.»
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- Esta alteração nada mais faria do que colocar o Decreto-Lei nº 32-A/2023 em concordância com a Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (CÓDIGO DO TRABALHO) na versão atualizada pela Lei n.º 93/2019, de 04 de setembro, onde no artigo 148.º, logo no número um, se lê que «A duração do contrato de trabalho a termo certo não pode ser superior a dois anos», e no nº 4 do artigo 149.º se lê «O contrato de trabalho a termo certo pode ser renovado até três vezes e a duração total das renovações não pode exceder a do período inicial daquele.» Ora, a primeira renovação de um contrato de um professor esgota automaticamente o estipulado nestes pontos como limite máximo temporal de renovação possível de um contrato a termo. Estas alterações que propomos permitem atrair jovens docentes para a carreira, pois contribuem para a existência de um caminho claro, previsível e seguro, até à vinculação.
- Discordamos do disposto no n.º 3 do art.º 45 quando este afirma que a denúncia do contrato durante o período experimental «obsta à mudança de índice nos termos previstos nos n.º 2 e 3» do art.º 44. Parece-nos que aqui existe uma situação em que um direito laboral (mudança de índice) é suprimido pelo uso legítimo de outro direito (denúncia do contrato em prazo legal).
- Propomos a redefinição do conceito de «Horário Anual», alterando o disposto no n.º 3 do art.º 42. No sentido de simplificar procedimentos e de moralizar a profissionalidade docente, defendemos que sejam contabilizados 365 dias de serviço para carreira, concurso e vinculação aos professores que:
- sejam colocados durante o primeiro período em horários que se prolonguem até final do ano letivo;
- realizam contratos de substituição temporária descontínuos por gozo obrigatório de férias (em alternativa poder-se-ia libertar o professor dessa obrigação). Esta medida evitaria a situação injusta de professores com exatamente os mesmos dias de serviço terem situações diferentes, um com ano completo, outro com ano incompleto. Sugere-se um período de carência entre o fim de um contrato e o início do próximo em que os candidatos (por estarem disponíveis em RR) se encontram em “trânsito” entre horários de trabalho. Estes períodos deveriam ser contabilizados como tempo de serviço à escola pública pois o professor demonstra disponibilidade e prontidão para a servir.
- Tomando como referência a legislação da RAA (nomeadamente o n.º 13 do art.º 23 do Decreto Legislativo Regional n.º 10/2021/A, de 19 de abril), bem como uma prática do continente que foi descontinuada, recomendamos a adoção do princípio de que os contratos temporários não devem ser interrompidos depois do dia 31 de maio.
- Recomendamos que se adote o princípio presente no ECD da RAA acerca das penalizações por desistência de colocações dos contratados a termo resolutivo, defendendo o direito do professor a mudar para uma situação laboral melhor. (Transcrevemos aqui o n.º 3 do art.º 47 do Decreto Legislativo Regional n.º 23/2023/A de 26 de junho de 2023. «Aos contratados a termo resolutivo, colocados em regime de substituição temporária ou horário incompleto, que denunciem o contrato para aceitarem colocação no âmbito da sua habilitação, em horário completo ou mais favorável, ou que ocorra até final do ano escolar, em unidade orgânica da rede pública regional, não é aplicada a penalidade por desistência do lugar.»)
- Rejeitamos absolutamente qualquer tipo de concurso híbrido (colocação pela lista graduada e colocação local por decisão subjetiva), já que um cenário destes iria necessariamente deteriorar o já frágil ambiente e a cultura democrática das escolas.
- Consideramos que a inclusão de todos os horários, sejam eles completos ou incompletos na sua componente letiva, nos concursos de Mobilidade Interna e Contratação Inicial é uma medida essencial para garantir equidade e transparência no sistema de colocação de professores em Portugal. Atualmente, a legislação não assegura explicitamente essa inclusão, o que pode deixar muitos horários incompletos à margem destas fases concursais, comprometendo o acesso justo às oportunidades de trabalho. A formalização desta garantia na lei ou regulamento adequado promoveria uma gestão mais eficiente do quadro docente e evitaria situações de precariedade, assegurando que todos os horários disponíveis sejam sempre considerados.
- Defendemos a aplicação do artigo 79.º do ECD também aos professores contratados, com base nos princípios da igualdade e da não discriminação. A distinção entre docentes dos quadros e contratados para efeitos de mobilidade desrespeita a igualdade de direitos, uma vez que ambos exercem as mesmas funções. O artigo 79.º nunca refere esta distinção, portanto considerarmos a prática habitual de a realizar como abusiva. Aplicar o artigo 79.º a todos os docentes, incluindo os contratados, é coerente com os objetivos do ECD de valorização e dignificação da função docente, garantindo uma gestão mais justa e eficiente dos recursos humanos na educação.
- Abrir a possibilidade de se realizarem permutas entre professores contratados, pois não existem razões objetivas para tal não acontecer e poderá constituir uma medida ágil para evitar desistências de colocações e, consequentemente, a falta de professores.
- Eliminar a precariedade na profissão docente é de facto uma urgência, e bons passos têm sido dados nesse sentido. No entanto, isso não elimina todos os prejuízos decorrentes de décadas de precariedade, por isso, não podemos esquecer os impactos colaterais negativos que dela decorrem em sede de aposentadoria. Os sucessivos governos mantiveram a precariedade da classe docente por longos anos, havendo muitos docentes que se aposentaram ainda como contratados. Nessa condição, o prejuízo foi duplo, pois se por um lado exerceram trabalho igual com salário desigual, por outro lado o vencimento da sua aposentadoria é afetado grave e injustamente. Todos os docentes nesta condição são credores legítimos do ME, assim, será justo que as entidades governativas e parlamentares trabalhem numa solução de exceção que minimize as injustiças criadas, ou seja, que se equacione/estude um mecanismo de aproximação entre as pensões dos lesados por esta ilegítima precariedade aos rendimentos de aposentadoria dos restantes docentes.
13 de dezembro de 2024
A direção da ANVPC